sábado, 20 de agosto de 2011

Reformados e, também, católicos! Por que não?


Parte I

Há um bom tempo que a maioria esmagadora das igrejas oriundas da Reforma Religiosa do século XVI viraram as costas para o seu passado comum. Observa-se que, hoje em dia, no protestantismo histórico e, principalmente, no evangelicalismo moderno, pouca importância é dada as suas origens fundacionais. A adoção – por parte de muitas instituições deste segmento da Cristandade – de uma postura presentista a-histórica ou de uma perspectiva futurista-triunfalista, ao lado de uma atitude de subestimação ou de rejeição do passado são, sem sombra de dúvidas, os piores legados do Modernismo e do Pós-Modernismo, dos quais vieram a se apropriar. Uma vez tendo cedido ao Zeitgeist e repudiado o seus fundamentos históricos, muitos protestantes e evangélicos, consciente ou inconscientemente acabaram cortando o cordão umbilical que os ligava à totalidade da igreja, ou seja, puseram a perder sua catolicidade. 

Catolicidade?

Desde muito cedo a igreja cristã desenvolveu um conceito muito importante acerca de sua própria natureza. Este conceito definia a Igreja como agência visível do reino de Deus, reputando-a como una, santa, católica e apostólica. Visto que a Igreja teve origem na pessoa histórica de Jesus Cristo, o Messias, a igreja cristã assumiu sua missão e identidade através do espaço e do tempo. A base fundamental da Igreja está na “Pedra”, ou seja, na afirmativa de uma verdade revelada, a saber: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus Vivo” (Mt 16:16). São Pedro, o autor desta frase áurea da confissão cristã, representou por meio dela o pensamento do colegiado apostólico e, de forma mais ampla, sacramentou o cerne da fé de toda comunidade dos fiéis, ao longo dos séculos. 

A abrangência universal da nova fé que portava a Igreja Cristã veio a se consolidar a partir da substituição da nação judaica, como expressão nacional e política, étnica e geograficamente localizada do Reino de Deus. Destarte, em obediência aos eternos desígnios de Deus, os discípulos de Jesus Cristo foram adiante, além do território hebreu, com o fim de anunciar a todos os povos a mensagem do Evangelho. O dia de Pentecostes, então, veio a marcar o início dessa nova orientação e rumo da Igreja. Após ter esperado confiantemente pela promessa de Jesus (c.f. At 1:8), a pequena comunidade cristã, então formada quase que exclusivamente por judeus, veio a receber do alto a virtude do Espírito Santo que a capacitou a anunciar o Evangelho pelo mundo afora. Os apóstolos, então, foram os instrumentos principais da expansão e dispersão das palavras de salvação, partindo de Jerusalém “até os confins da terra”. Esse foi o marco histórico inicial da existência e trajetória do que acreditamos ser a Igreja Católica.

E o que nós, protestantes, temos que ver com isso?

Bem, essa é uma boa pergunta. É exatamente o tipo de pergunta pelas quais muitos cristãos reformados e evangélicos não têm demonstrado tanto interesse em responder. Mas, já que esta questão está sendo levantada justamente por um protestante, permitam-me tentar elaborar uma resposta satisfatória. 

Em primeiro lugar, acredito que seja importante ressaltar o fato de que todos os principais ramos protestantes do cristianismo (luterano, calvinista e anglicano), se formaram a partir dos esforços um núcleo básico de pessoas que propunha uma série de reformas na Igreja de então. Sabe-se, por certo, que algumas das principais demandas dos reformadores do século XVI consistiam de manifestos em prol do resgate da simplicidade teológica legada pelos pais apostólicos e eclesiásticos, pela purificação do culto – aos moldes da praxe da igreja dos quatro primeiros séculos. Em segundo lugar, os reformadores eram homens apaixonados pela Igreja e zelosos membros dela: Lutero, um monge agostiniano; João Calvino, um teólogo brilhante que preparava-se para ser padre; Thomas Cranmmer, Arcebispo de Cantuária, clérigo do topo da hierarquia da Igreja na Inglaterra. Em terceiro lugar, os reformadores não pretenderam, jamais, promover um cisma e, muito menos, criar uma nova igreja. Eles estavam convictos do dever da manutenção da unidade da Igreja. Contudo, para tais homens, a unidade deveria ter como fundamento a verdade, a fidelidade às Sagradas Escrituras e a consonância com os ensinos dos principais teólogos cristãos dos quatro ou cinco primeiros séculos do Cristianismo, na medida em que estes estivessem de acordo com a revelação cristã, conforme expressa na Bíblia Sagrada. 

No próximo texto, iremos abordar o conceito de catolicidade a partir dos escritos de alguns grandes expoentes da Igreja pós-apostólica e primitiva, por meio do que buscaremos lançar mais luz sobre a questão proposta neste texto.

Frei Leonardo Morais, Jr., ofa, é graduando em Economia, estudante de Teologia e postulante ao Ministério Ordenado pela Igreja Anglicana, Diocese do Recife.

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